quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

Natal HM

A rede de lojas que foi precursora dos desfiles de Natal em Blumenau O "Magia de Natal" dos anos 60 ficou na memória de gerações de blumenauenses
Por Bianca Bertoli 18/12/2018 Jornal O Município de Blumenau. Se hoje o Magia de Natal cria boas memórias na cabeça de muitas crianças, os Natais da loja Hermes Macedo exerceram o mesmo papel para gerações de blumenauenses. A rua XV de Novembro, no Centro, começava a se verticalizar na década de 1960. O comércio ganhava diversidade e abria espaço ao turismo, que apenas engatinhava. Naquele período, os desfiles e a decoração promovidos pela rede paranaense conhecida como HM atingiram o auge. Os blumenauenses vestiam as melhores roupas e seguiam para a área central da cidade. Muitos levavam os filhos para acompanhar a passagem do menino Jesus, do Papai Noel, dos soldados romanos, de princesas, duendes, rainhas, palhaços e outros personagens que contavam a história do Natal. “Era um desfile por ano, que abria as festas de Natal. Acredito que era no sábado, no final da tarde. Era a festa de Natal da cidade. Um sonho aguardado o ano inteiro por adultos e crianças”, lembra o publicitário José Geraldo Reis Pfau, filho de Osmênio Pfau, que trabalhou na empresa por 35 anos. Pfau, que estava no início da adolescência no começo dos anos 60, acompanhava o pai, que era gerente, durante as férias escolares. Nos bastidores, via toda a movimentação para organizar o espetáculo que encantava moradores e turistas. Não à toa, guarda com paixão diversas fotos daqueles anos. Os que desfilavam eram voluntários, funcionários da HM e familiares. Surgiam sobre caminhões e carros alegóricos ou caminhavam da prefeitura (atual Fundação Cultural) até a rua Amadeu da Luz. O ponto alto dos desfiles era a chegada do Noel, que tinha barba sintética. O som das bandas (muitas vezes de escolas) ou dos carros com alto-falantes, que ecoavam pela via, disputava espaço com o barulho de foguetes. “O que se faz hoje no Magia de Natal não deixa de ser uma releitura do que se fazia nos anos 1960. Para aquela época, era altamente significativo. A HM motivou a dinâmica do Natal na cidade”, conta a historiadora e diretora do Arquivo Histórico, Sueli Petry. Presépio encantava as crianças Dentro da magazine havia outro encanto embaixo de uma escada: o presépio formado por bonecos móveis de madeira, vindos do Paraná. “Uma vez eu coloquei por brincadeira uma moeda na manjedoura e, quando vimos, os clientes encheram de moedas. Doamos tudo para uma instituição de caridade”, lembra, aos risos, Valdir Salvador, vendedor da loja nos anos de 1960. O jeito descontraído e alegre deu a Salvador um codinome durante os desfiles, quando ele se transformava em palhaço: Risadinha. E Risadinha foi também o Papai Noel, que recebia as crianças dentro da loja. Em dois anos o Noel da HM, que vinha de Curitiba, não conseguiu chegar a Blumenau. Salvador então assumiu o ofício: “Era um calor infernal debaixo daquela roupa, mas o sorriso das crianças valia o sacrifício”. Quando não era nem Risadinha e nem Nicolau, o vendedor da chamada linha branca era o responsável por manter as músicas natalinas tocando ininterruptamente no interior do estabelecimento. Salvador colocava o disco na vitrola e o som tomava conta do lugar. Até hoje, aos 74 anos, ele escuta canções para relaxar, ao anoitecer. Quem montava e enfeitava toda a loja eram os profissionais da equipe de decoração, liderada por Waldemar Kruger. O chefe do setor veio transferido de Curitiba no final da década de 1960. Com a esposa e quatro filhos começou uma nova vida em terras catarinenses. Erica Kruger ainda lembra do esforço e amor que o pai tinha pelo trabalho: “Ele criava os carros alegóricos e a brincadorama (espaço dentro da loja onde ficava o Papai Noel), que cada ano tinha um tema diferente. O mesmo tema era visto na brincadorama e no desfile. Ele também desenhou um arco de Natal, que ficava na frente da loja”, detalha Kruger. Desenho de um arco de Natal feito por Waldemar Kruger – Arquivo pessoal/Erica Kruger Com o apoio circense (Circo Bartolo de Curitiba), que fazia a coreografia e trazia as fantasias para os desfiles, os funcionários da equipe liderada por Kruger ficavam com a missão de desenvolver painéis, esculturas criativas de isopor, presépios, e enfeites dos carros alegóricos. Os clientes se misturavam aos visitantes que apenas queriam admirar a fachada mais chamativa da rua XV (com direito a um arco instalado no alto da via) ou ver o presépio de perto. A grande festa dos finais de ano foi perdendo força com o tempo. Nos anos 1970, a prefeitura passou a decorar as ruas do Centro para o Natal. Kruger morreu em 1989, quando ainda era chefe do setor de decoração. Ele viu os desfiles e enfeites exuberantes que criava perderem força, mas não chegou a presenciar o fim de tudo, nos anos 1990. A filha acredita que o sofrimento teria sido incalculável para quem, na opinião dela, fez parte de um trabalho que inspira o Natal blumenauense até hoje. A Loja Hermes Macedo Em 12 de maio de 1952, Hermes Macedo S/A inaugurava uma filial em Blumenau. Era a quinta loja da organização e a primeira fora do Paraná. O prédio fora alugado de Teófilo Zadrosny e o projeto de reforma foi do arquiteto Rubens Meuster. Em 1963 a loja, que ficava próxima ao prédio do antigo banco Besc, na XV, transformou-se em um shopping center da época, mudando para onde hoje fica o centro comercial Bremen Zenter. “Era uma loja completa, com mercadorias de varejo. Roupas, linha branca (geladeira, fogões), móveis, eletrodomésticos, eletrônicos, bicicletas, lambretas, motores, tapetes, porcelana, calçados, pneus, bateria para carro, peças de autos e caminhões, e tinha até um bar interno, o “Früstick Bar”,¨ponto de cafezinho e lanches”, descreve Pfau.Nos finais de ano a Brinquedorama, como ficou conhecido o espaço dentro da loja catarinense, tinha a presença do Papai Noel e do trono dele em meio a diversos brinquedos à venda. A loja fechou de vez em 1997. Os Natais da época, porém, permaneceram na memória da cidade e inspiraram a reativação recente dos festejos de rua.